domingo, 12 de março de 2017

Você sabe o que é hiperatividade simpática paroxística?


A hiperatividade simpática paroxística, também conhecida como tempestade simpática, convulsões diencefálicas, tempestade autonômica, síndrome de disfunção autonômica, instabilidade autonômica paroxística com disautonomia ou simplesmente disautonomia, é uma complicação relativamente frequente em neurointensivismo. Os episódios são vistos em até um terço dos pacientes com trauma cranioencefálico grave e doença axonal difusa; e também podem ser secundários a outros eventos, como encefalopatia hipóxico isquêmica, hemorragia subaracnóide, hematoma intraparenquimatoso ou hidrocefalia, porém de forma menos frequente.

As crises podem ser estimuladas ou ocorrer de forma espontânea e a sua fisiopatologia parece estar relacionada à estimulação ou inibição de áreas simpatoexcitatórias no cérebro e tronco cerebral, secundária à perda do controle cortical e subcortical. O “reset” dos barorreflexos poderia explicar a coexistência de hipertensão e taquicardia, enquanto que uma combinação de aumento da liberação de catecolamina e do tráfego neural simpático poderia explicar o aumento da pressão de pulso durante os episódios. Por fim, a ativação de reflexos somatossimpáticos dos mecanorreceptores ou quimiorreceptores musculares durante episódios de hipertonia ou flutuações na pressão intraventricular poderiam desencadear as crises paroxísticas.

Manifestações clínicas

- Manifestações típicas: alterações na temperatura corporal, pressão arterial, frequência cardíaca, frequência respiratória e tônus muscular.
- Outros: midríase, rubor e distonia. Podem preceder episódios de hipertensão intracraniana.
- Início 5-7 dias após a injúria, mas pode ocorrer antes.
- As crises podem ocorrer ate 3x/dia, com duração variando entre menos de 1 hora até mais de 10 horas. Com o tempo o número de episódios diminui, porém o tempo das crises aumenta.
- Duração total de 1-2 semanas até vários meses.

Diagnóstico

- Presença de 4 ou mais dos seguintes critérios na ausência de outra causa que os justifiquem:
  • T>38,3 ºC
  • FC>120 bpm (ou >100 bpm se uso de  beta-bloqueadores)
  • Pressão arterial sistólica >160 mmHg ou pressão de  pulso > 80 mmHg
  • Frequência respiratória >30 ipm
  • Diaforese.
  • Posição em extensão ou distonia severa


    - Sempre excluir diagnósticos diferenciais, como sepse e crise convulsiva. Desta forma pode ser interessante a coleta de culturas e demais exames para rastreio de processo infeccioso, além de um eletroencefalograma. Outros exames interessantes nos casos suspeitos são tomografia computadorizada de crânio, para excluir hidrocefalia, e ressonância magnética de coluna cervical e torácica, já que crises de disautonomia podem ocorrer em pacientes com trauma raquimedular acima de T5.

    Tratamento

    - Atenção a alguns possíveis fatores desencadeantes, como dor, bexigoma, manipulação do cateter de Foley, mudança de decúbito.
    - Tratamento agressivo da febre.
    - Atenção à hidratação, já que estes pacientes têm perdas insensíveis aumentadas.

    Terapia farmacológica
    - EVITAR antagonistas dopaminérgicos, como haldol, clorpromazina. Estas medicações podem piorar as crises.

    Morfina
    Medicação mais efetiva para abortar as crises.
    Dose recomendada: 2-8mg IV nas crises.

    Propranolol 
    Reduz a frequência e a severidade dos episódios por reduzir o efeito das catecolaminas circulantes.
    Preferir beta-bloqueadores não seletivos (ex: propranolol, labetalol), os seletivos são pouco efetivos.
    Dose recomendada: 20-60 mg a cada 4-6h VO.

    Clonidina
    Alfa-dois agonista com ação central e periférica, utilizado para o tratamento da hipertensão e taquicardia.
    Dose recomendada: 0,1 a 0,3 mg 3x/dia, máximo de 1,2 mg ao dia. VO.
    Atenção: a medicação pode causar queda excessiva da pressão entre as crises, podendo gerar baixo fluxo cerebral.

    Bromocriptina
    Agonista dopaminérgico D2. A utilização da bromocriptina para esta indicação baseia-se nas semelhanças entre disautonomia e síndrome neuroléptica maligna, que é causada pelo bloqueio da dopamina.
    Dose recomendada: 1,25mg 2x/dia VO, poderá ser titulado até 10-40mg/dia.
    Atenção: Pode reduz o limiar convulsivo e está contraindicada nos casos de hipertensão não controlada.

    Baclofeno 
    GABAB agonista utilizado para o tratamento dos espasmo musculares.
    Dose recomendada: 5mg VO 3x/dia, até 80mg/dia.
    Atenção: Evitar súbita descontinuação pelo risco do desencadeamento de crises convulsivas,  rigidez, febre e disautonomia.

    Benzodiazepínico 
    Interessante pelos efeitos de relaxamento muscular, sedação e ansiolíse.
    Dose recomendada: Midazolam 1-2mg IV ou lorazepam 2-4mg IV ou diazepam 5-10mg IV. Preferir diazepam.
    Seus efeitos são inferiores aos dos opióides, mas são preferíveis se grande componente de ansiedade presente.

    Gabapentina
    A gabapentina liga a subunidade α2δ dos canais de cálcio pré-sinápticos voltagem dependentes e age principalmente pela inibição da liberação de neurotransmissor no corno dorsal da medula espinhal e em todo o sistema nervoso central.
    Usar quando os outros agentes falharam no controle das crises ou na fase de recuperação para pacientes com lesão cerebral subaguda e manifestações disautonômicas mais leves.
    Dose recomendada: Começar com 300-900mg/dia, ate 3600-4800mg/dia VO.

    Dantrolene
    É indicado para o tratamento de síndrome neuroléptica maligna e hipertermia maligna. É particularmente eficaz nos casos de postura distônica severa.
    Dose recomendada: 0,25-2mg/kg IV a cada 6-12h, dose máxima de 10mg/kg/d.
    Contra indicado se insuficiência hepática aguda. Pode causas hepatite fulminate.


    Referência


    Um comentário:

    1. Que bacana! Ver os médicos aos quais trabalhei na UTI e aprendi tanto como Dr. Daniere, Dr. Rodrigo, Dra. Sanmya, Dr. Sergio, me ensinaram tanto e continuarão me ensinando. Eu procurando algo sobre tempestade autonômica, me deparo com esse blog que me elucidou muita coisa! Obrigada! Vou usar e abusar dos conhecimentos aqui postados!

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