terça-feira, 2 de junho de 2015

Albumina: há evidências?

A albumina é a proteína circulante mais abundante do plasma. Ela é responsável pela regulação da pressão oncótica plasmática, além de outras propriedades não-oncóticas, como ligação e transporte de ínumeras substâncias, imunomodulação, função antioxidante e antiinflamatória. A diminuição do seu nível sérico circulante é comum em estados inflamatórios agudos e crônicos devido, entre outros fatores, a diminuição de sua produção para síntese de proteínas inflamatórias e ao escape do intravascular pela perda da integridade endotelial. A relação entre hipoalbuminemia com piores desfechos contribuiu para a ampla utilização da terapia com albumina, além do seu uso como expansor plasmático desde a II Guerra Mundial. Existem evidências, entretanto, para seu uso?
Trabalhos publicados desde a década de 70 tentaram elucidar o assunto, porém com resultados conflitantes. Alguns mostraram benefício na sua utilização, especialmente pelos efeitos antiinflamatórios e imunomoduladores. Porém, estudos maiores com desenhos de melhor validade externa foram surgindo ao longo dos últimos anos. Para citar alguns importantes em terapia intensiva, o estudo SAFE, publicado em 2004, examinou a ressuscitação com albumina (versus cristaloíde) e não mostrou benefício na mortalidade em 28 dias. O estudo italiano ALBIOS, de 2014, utilizou a reposição diária de albumina, quando em baixo nível sérico, em pacientes com sepse grave ou choque séptico e também não mostrou benefício em mortalidade e outros desfechos clínicos. Duas grandes meta-análises do ano passado também não mostraram benefícios no uso da albumina como expansor plasmático quando comparado com cristalóides. Já em relação a hipoalbuminemia, os estudos são claros em relacionar o baixo nível sérico como fator de risco independente para desfechos negativos mas não há benefício na terapia com albumina para mudança destes desfechos. Outros cenários onde faltam evidências são: grande queimado, pancreatite, trauma, cirurgias e desnutrição.
Mas então onde há indicação de albumina? Em hepatologia. Vários trabalhos mostram benefício e guidelines internacionais a recomendam como primeira linha para o paciente hepatopata em três situações: síndrome hepatorrenal, peritonite bacteriana espontânea e reposição em grandes paracenteses.
Portanto, apesar da sua ampla utilização, não há evidência suficiente para a administração de albumina de maneira geral para o paciente crítico, especialmente na ressuscitação volêmica e para hipoalbuminemia. Seu uso deve ser limitado a um grupo específico de pacientes onde há benefício até que futuros ensaios clínicos randomizados possam estender suas indicações.

  1. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25042164

3 comentários:

  1. E na síndrome nefrotica? Outra coisa, a suviving recomenda a administração de alguma albumina na expansão volêmica de pacientes que ja receberam grandes quantidades de cristaloides. O certo e que "coça a mão" pra fazer em pacientes que estao recebendo grande quantidade de volume em expansao na sepse. O que vc acha, Dr. House?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigado pela pergunta, Dr. Anônimo (rs)
      Apesar do racional fisiológico na utilização da terapia com albumina, realmente ainda não há estudos em Terapia Intensiva que definitivamente comprovem seu benefício. Também não há evidência de malefício. O citado estudo SAFE, que é um dos maiores já conduzidos sobre o assunto com quase 7 mil pacientes, mostrou que a solução albuminada a 4% é tão segura quanto a solução salina, além de ter trazido a relação de equivalência albumina/cristalóide de 1:1.4. Essas vantagens podem pesar a favor do seu uso em algumas situações mesmo sem evidências fortes na literatura, como no exemplo que você citou de utilizar menos volume para restabelecimento de fluxo tecidual em pacientes com balanço hídrico muito positivo. Só cuidado para não “coçar a mão” em fazer mais volume em paciente que não é fluidorresponsivo.
      Ainda sobre o SAFE, a análise do subgrupo de pacientes sépticos que utilizou albumina mostrou vantagens na mortalidade. Esse tipo de análise deve ser interpretado com cautela, independente da significância estatística, tendo sua maior utilidade em gerar hipóteses para novos estudos com desenho específico para tal população. Tanto é que a recomendação na Surviving Sepsis Campaign (SSC 2012) é fraca (2C). Eles também se basearam no estudo francês EARSS de 2011, apresentado no congresso europeu em Berlim do mesmo ano (não publicado até agora), no qual Albumina a 20% foi melhor que a solução salina em sepse grave SEM significância estatística... Pois é.

      Excluir