sábado, 7 de junho de 2014

Corticóide no trauma raquimedular: fato ou mito?


              O tratamento com metilprednisolona é o único tratamento medicamentoso com evidencias que sugerem melhora na evolução de pacientes com trauma raquimedular (TRM) agudo, entretanto estas evidências são fracas e por isso seu uso bastante discutível. Evidências de estudos em animais demostram que a administração de glicocorticóides após TRM agudo reduz edema, previne a depleção de potássio intra-celular e melhora a recuperação neurológica. Mas afinal, o que dizem os grandes estudos e os guidelines do assunto?...

         Dois estudos randomizados controlados analisaram o efeito da administração de metilprednisolona em paciente com TRM agudo. O estudos NASCIS II (1) comparou o uso de metilprednisolona (bolus de 30 mg/Kg IV seguido da administração de 5,4 mg/Kg/h por mais 23 horas), naloxona e  pacebo em 427 pacientes com TRM. Não houve diferença na análise de deficit neurológico em 1 ano, entretanto no grupo de paciente tratados em até 8 horas do trauma, o grupo que recebeu metilprednisolona teve discreta diferença a seu favor em relação a melhora do deficit motor. Infecções foram mais frequentes neste grupo de pacientes. No estudo NASCIS III (2) foram comparados dois esquemas de tratamento com metilprednisolona (administrada por 48 ou por 24 horas) com um potente inibidor de peroxidação lipidica. Todos os 499 pacientes receberam a dose inicial em bolus de 30 mg/Kg de metilprednisolona e foram tratados dentro de 8 horas do trauma. A extensão do tratamento por mais 24 horas, ou seja, a administração da dose de manutenção (5,4 mg/Kg/h) por 48 horas foi associado a com maior recuperação motora, o que não representou melhora da recuperação funcional. Pacientes que receberam metilprednisolona por 48 horas apresentaram mais sepse grave e pneumonia grave que o grupo que utilizou corticóide por 24 horas. Não houve diferença de mortalidade nos grupos do estudo. Uma metanálise incluido o estudo NASCIS II e outros 2 estudos concluiram que o uso de metilprednisolona dentro de 8 horas do trauma resultou em melhora na recuperação motora.
Guidelines: em 2013 a American Association of Neurological Surgeons and Congress of Neurological Surgeons  defininiu que o uso de corticoide em TRM agudo não é recomendado. A Canadian Association of Emergency Physicians, endossado pela American Academy of Emergency Medicine recomenda que o tratamento com glicocorticóides é uma opção e não o tratamento padrão em paciente com TRM agudo fechado. 
Apesar das mais recentes evidencias apontando que não existe evidencia de melhora funcional e existe aumento do risco de infecções, o que desencoraja seu uso, na prática há elevado uso de metilprednisolona nestes pacientes, uso este que foi disseminado após os estudos NASCIS. Estudo polones publicado em 2014 interrogou neurocirurgiões sobre o uso de metilprednisolona no TRM agudo e 73,1% deles declararam usar, sendo que 41,7% usavam conforme o protocolo do estudo NASCIS II (3). Um estudo realizado em hospitais universitários da Alemanha e publicado em 2013 revelou que 55% dos departamentos entrevistados utilizavam metilpredisolona no tratamento de TRM agudo e entre estes 73% eram prescritores frequentes (mais de 50% dos pacientes) (4)
É importante lembrar que estamos tratando do TRM agudo, e que qualquer beneficio só foi constatado quando da administração nas primeiras 8 horas e que os estudos excluiram pacientes com trauma raquimedular por arma de fogo e outros traumas abertos, onde dose elevada de corticóide aumento sobremaneira o risco de infecções graves.
Referências
1 - http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/8410217
2 - http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9168289
3 - http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24496913
4 - http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/23446768

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