O edema pulmonar neurogênico é uma síndrome clínica caracterizada pelo
aparecimento agudo de edema pulmonar em consequência de um insulto neurológico
grave.
Apesar de identificada há cerca de 100 anos, continua sendo uma condição
negligenciada pela maioria dos médicos na prática diária, muito provavelmente
em decorrência da baixa prevalência, ausência de conhecimento dos profissionais
de saúde e marcadores diagnósticos, bem como características semelhantes a
outras patologias.
A entidade foi descrita pela primeira vez em 1908 quando W.T. Shanahan
descreveu 11 episódios de edema agudo de pulmão (EAP) complicando casos de
status epilépticos. Durante a primeira guerra mundial Francois Moutier mostrou
a correlação de pacientes que haviam recebido tiro na cabeça e agudamente
desenvolvido EAP. O mesmo aconteceu ao longo da guerra do Vietnam, quando 17
soldados morrendo com ferimento por arma de fogo em região cefálica evoluíram
com esta patologia pulmonar.
Como a maioria das informações clínicas são derivadas de séries de
autopsias e estudos de caso, a incidência não é conhecida e provavelmente acaba
sendo subestimada. Em pacientes com hemorragia subaracnóide (HSA) a incidência
varia entre 2% e 42,9%. Já em traumas neurológicos o valor aproxima de 20%. Status
epiléptico raramente evoluem com edema agudo pulmonar, entretanto autópsia de
doentes nesta condição e que morreram de forma súbita e inesperada, sugerem que
a causa do óbito, em 80 – 100% dos casos ocorre em decorrência de edema de
pulmão.
Inúmeras são as condições neurológicas que podem evoluir para o edema.
São elas: trauma cranioencefálico (TCE), status, lesão espinhal por trauma
raquimedular, HSA, hemorragia intraparenquimatosa, overdose de medicamentos,
esclerose múltipla, meningoencefalites, infarto de medula espinal, malformação
arteriovenosa e gliomas. Na grande maioria dos casos o insulto no sistema
nervoso central costuma ser catastrófico.
Existem duas formas distintas de apresentação clínica. A mais comum é a
precoce, com tempo de aparecimento de minutos a horas após a agressão
neurológica. Em contrapartida, a apresentação tardia se desenvolve de 12 a 24
horas após a injuria. Os pacientes evoluem rapidamente com dispnéia, taquipnéia,
queda de saturação, hipóxia, eliminação de secreção rósea e espumosa pela via
aérea, hiperatividade simpática com hipertensão, febre, taquicardia e
leucocitose. Além disso, radiografia de tórax com infiltrado pulmonar bilateral
e com predomínio perihilar.
Em relação à fisiopatologia este edema pulmonar usualmente ocorre como
consequência do aumento abrupto e súbito da pressão intracraniana (PIC), embora
esta condição não seja totalmente necessária. A elevação da PIC acaba por gerar
sofrimento neuronal (isquemia, compressão), o que por sua vez leva a ativação
do sistema nervoso simpático e a liberação de catecolaminas de forma exagerada.
Embora não esteja totalmente estabelecida esta correlação, estudos em modelos
animais com bloqueio simpático, através de drogas intratecais, como lidocaína,
evitaram a progressão do processo e suportam esta teoria. Apesar da dificuldade
de entender o mecanismo responsável pela liberação de catecolaminas, os locais
do cérebro que são implicados no processo já estão claramente estabelecidos.
São eles bulbo e hipotálamo, estruturas com grande quantidade de neurônios
catecolaminérgicos.
A ativação do sistema nervoso simpático altera as forças de Starling, o
que gera aumento da pressão hidrostática capilar direcionando fluido do vaso
para o interstício e posteriormente para o alvéolo.
Outro contribuinte é o aumento da permeabilidade capilar que coexiste com
o mecanismo acima descrito. Entretanto, ainda não se sabe como isto de fato
ocorre e atualmente 4 teorias tentam justificar o aumento de pressão nos capilares:
1. Teoria neuro - cardíaca: Apesar do acúmulo de líquido alvelolar e
intersticial ocorrer tradicionalmente em doentes sem alterações cardíacas,
evidências sugerem que pelo menos uma parcela dos pacientes com lesão
neurológica grave e edema pulmonar apresente disfunção miocárdica. É a síndrome
de Takotsubo. Nesta condição as próprias catecolaminas geram injúria nos
miócitos e contribuem para a formação de edema.
2. Teoria neuro – hemodinâmica: A ativação simpática geraria aumento da
pós-carga do ventrículo direito e esquerdo, devido aumento de pressão na raiz da
aorta e da pulmonar, gerando edema.
3. Teoria “Blast” (explosão): As duas teorias acima conseguem descrever o
aumento da pressão capilar como causa do edema, contudo não explicam a presença
de proteínas e glóbulos vermelhos no fluído alveolar. Esta teoria supõe que a
ativação simpática geraria vasoconstricção sistêmica e pulmonar, que desviaria
fluxo da circulação sistêmica para a baixa resistência e alta complacência dos
vasos dos pulmões. O aumento da pressão de forma súbita seria responsável por
induzir lesão do endotélio e permitir vazamento de exsudato para dentro do
espaço alveolar.
4. Teoria da hipersensibilidade adrenérgica das vênulas pulmonares: A teoria
é baseada na presença de receptores alfa e beta adrenérgicos nas veias
pulmonares. O efeito simpático geraria vasoconstrição venosa isolada e isto
seria responsável por aumento da pressão capilar e edema de pulmão.
O diagnóstico é muito difícil de ser confirmado, pois os sinais clínicos
e os exames não são específicos. Portanto, a patologia é sugerida quando o
paciente apresenta edema agudo de pulmão na presença de insulto neurológico
agudo e na ausência de outro diagnóstico mais provável. Embora não exista
validação, os critérios abaixo foram propostos para facilitar diagnóstico e
classificar a doença.
- Opacidade bilateral em radiografia de tórax
- PaO2/Fio2 < 200
- Ausência de evidência de hipertensão atrial esquerda
- Presença de lesão neurológica aguda (severa o suficiente para gerar
aumento de PIC)
- Ausência de outras causas de insuficiência respiratória aguda ou síndrome
do desconforto respiratório agudo (sepse, aspiração, transfusão de sangue)
O prognóstico das pessoas com edema agudo de pulmão neurogênico é
determinado pelo curso do insulto neurológico e não pelo quadro pulmonar,
embora este seja um contribuinte. Portanto, o pilar do tratamento deve ser
focado na desordem neurológica, uma vez que ela é o gatilho para manutenção da
ativação simpática. A maioria dos episódios pulmonares são tolerados e
resolvidos em torno de 48 – 72 horas. Inicialmente deve ser prestada
assistência respiratória com aporte de O2, ventilação não-invasiva e
eventualmente ventilação mecânica. Não existe um alvo de PaO2 ou
saturação de oxigênio, contudo o paciente não deve permanecer hipoxêmico, pois
existe o risco de lesão cerebral secundária. Em relação à ventilação mecânica
alguns cuidados não podem ser negligenciados, dentre estes devemos ter atenção
aos altos valores de PEEP para evitar diminuição do retorno venoso e aumento da
PIC, e também a hipercapnia que gera vasodilatação e edema cerebral.
O uso de diuréticos, diminuição de infusão de fluídos e balanço hídrico
zerado ou negativo são importantes para melhorar o edema. Medicamentos anti-receptores
alfa adrenérgicos têm potencial de bloquear o ciclo vicioso de ativação
simpática, apresentam resultados satisfatórios em modelos animais, contudo existem
poucos casos relatados em humanos. As mais estudadas seriam clorpromazina,
fentolamina e fenoxibenzamina. Propofol apresentou resultados interessantes em
modelos animais, contudo não existe nenhum estudo na prática diária que justifique
sem uso na rotina diária.
Concluindo, apesar de décadas de experimentos científicos e relatos de
caso, o diagnóstico e o manejo continuam controversos e desafiadores. A
patologia segue subdiagnosticada e os estudos limitados.
1. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26146119
2. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26066018
3. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25572647
4. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25496372
5. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25101198
6. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24548468
7. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24548468
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4. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25496372
5. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25101198
6. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24548468
7. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24548468
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