A pancreatite aguda é um
processo inflamatório pancreático, de etiologia variável (principal causa
litíase biliar ~ 30-40%), cuja mortalidade varia de 3% em pacientes com
pancreatite edematosa intersticial até ~20% em pacientes que cursam com necrose
pancreática. Geralmente é autolimitada e resolve-se em poucos dias. Uma minoria
de pacientes cursam com necrose pancreática que caracterizam os quadros graves, com
intensa resposta inflamatória sistêmica/disfunção de múltiplos órgãos.(Figura 1)
A infecção é uma
complicação frequente nos casos graves, em especial na presença de necrose
pancreática extensa, decorrente da provável translocação bacteriana. As
recomendações atuais sugerem que as estratégias nutricionais podem ser
protetoras, reduzindo o risco de infecção e consequentemente a mortalidade na
pancreatite grave, apesar da limitada base de evidências...
Figura1. Definição, classificação evolutiva e complicações |
Os pacientes com
pancreatite leve podem ser conduzidos com hidratação intravenosa inicial,
já que a recuperação ocorre rapidamente, permitindo que os pacientes retomem a dieta
via oral dentro de poucos dias (3-5 dias). Já nos pacientes com pancreatite
moderada e grave, muitas vezes é necessário um suporte nutricional, visto que
geralmente não toleram retomar a ingestão oral em menos de 5-7 dias.
Neste casos, prefere-se o suporte enteral ao parenteral.
O estudo PYTHON [1],
publicado em 2014 no New England Journal
of Medicine, buscou demonstrar os benefícios do suporte enteral precoce na
redução de infecções e mortalidade em pacientes com pancreatite aguda grave.
Foram incluídos 208 pacientes em 19 UTIs na Holanda, os quais apresentavam um
alto risco de complicações (escore APACHE II > 8, PCR > 150mg/L). Os pacientes foram randomizados em 2 grupos: inicio precoce da dieta enteral (dentro de 24 horas) e o outro grupo com jejum por 72horas e posterior inicio
de dieta enteral ou oral.
Aproximadamente 62% dos
pacientes apresentavam necrose pancreática. Após 6 meses de seguimento, não
houve diferença significativa nos desfechos primários, composto por evento
infeccioso ou morte.
Este estudo randomizado não
mudou a rotina de cuidados nessa população, que apesar de escassas sólidas
evidências, as principais recomendações atuais resumem-se:
- Dieta oral: casos de pancreatite leve, na ausência de íleo significativo,
náuseas ou vômitos, a alimentação oral pode ser iniciada assim que a dor reduzir
e os marcadores inflamatórios apresentarem melhora, o que ocorrem em média 24 a 48horas
após o início do quadro [2]. As evidências sugerem que a alimentação
precoce nos pacientes que têm fome e tolerância não depende da resolução completa
da dor abdominal ou normalização das enzimas pancreáticas [3,4]. Na pancreatite
moderada a grave, inicialmente a alimentação oral em geral não é tolerada
devido a dor, náuseas e vômito, mas deve ser reintroduzida progressivamente
mediante tolerância.
- Dieta enteral: a nutrição enteral é preferível a parenteral para pacientes com
pancreatite aguda moderada e grave que não toleram a alimentação oral. Em geral
casos com extensa necrose, SIRS e disfunções de múltiplos órgãos. Como já
discutido, apesar do racional fisiológico que sugere um efeito "protetor" da dieta à translocação bacteriana, o início precoce (< 24h) não demonstrou superioridade nos
desfechos infecção e mortalidade. Em relação a posição da sonda, não existem
boas evidências que suportem a necessidade de locar a sonda além do ligamento
de Treitz. Dois ensaios controlados comparando posição gastrica com jejunal não
encontraram diferenças na tolerância ou complicações maiores [5,6]. A presença
de coleções líquidas ou enzimas pancreáticas elevadas não é necessariamente uma
contra indicação para a alimentação oral ou enteral. No entanto, neste subgrupo
há uma associação clara de dor abdominal após alimentação. Nos casos de
intolerância significativa da oferta enteral até o 5-7 dia, sugere-se o inicio
de nutrição parenteral, com periódicas reavaliações.
-
Dieta
parenteral: deve ser considerada apenas em pacientes que não toleram a
alimentação entérica. Nos primeiros dias (5-7 dias) de introdução da enteral, não
sugere-se suplementação com nutrição parenteral em busca do alvo calórico
proteico (especialmente em pacientes eutróficos pré evento – IMC > 18).
[7,8]
Referências:
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