quinta-feira, 15 de março de 2012

Somatostatina, Octreotite e Terlipressina em Hemorragia Digestiva Varicosa Aguda



Quatro terapias farmacológicas estão disponíveis no Brasil para uso em Hemorragia Digestiva Varicosa Aguda: terlipressina, somatostatina, octreotide e vasopressina. Afinal, o que usar, quando e por quanto tempo? Revisamos este assunto neste post...

A terlipressina (triglycyl lisina vasopressina) é um análogo de ação prolongada da vasopressina, associado à menor frequência de efeitos colaterais cardiovasculares por atuação preferencial nos receptores V1. Seu uso se associa à redução significante das pressões portal e intravaricosa e do fluxo da veia ázigos, com efeito prolongado por aproximadamente quatro horas. Em contraste com a vasopressina, terlipressina podem ser administrados como injeções intermitentes, em vez de infusão intravenosa contínua e tem um perfil de reações adversas mais seguro. 
A somatostatina inibe a liberação de hormônios vasodilatadores, como glucagon, indiretamente causando vasoconstrição esplâncnica e menor fluxo portal. Ele tem uma meia-vida curta e desaparece dentro de minutos de uma infusão debolus. O octreotide é um análogo de longa ação da somatostatina.
Uma metanálise (Cochrane – 2003) foi realizada para determinar se o tratamento com terlipressina melhora o resultado na hemorragia aguda por varizes de esôfago e é seguro. Vinte estudos foram identificados para todos os grupos de comparação, envolvendo 1609 pacientes. Houve sete estudos (com 443 pacientes) comparando terlipressina a placebo, dos quais cinco foram considerados estudos de alta qualidade. A meta-análise indica que terlipressina foi associado com uma redução estatisticamente significativa na mortalidade por qualquer causa em comparação com placebo (risco relativo 0,66, IC 95% de 0,49% a 0,88). Três estudos (com 302 pacientes) foram identificados comparando terlipressina a somatostatina, dois dos quais eram estudos de alta qualidade.  Apenas um estudo de alta qualidade (219 pacientes), comparando terlipressina ao tratamento endoscópico foi identificado. Dentro do poder limitado fornecido por esses pequenos números de pacientes, não houve diferença estatisticamente significativa entre terlipressina e somatostatina ou tratamento endoscópico em nenhum dos desfechos. Para os demais grupos de comparação (terlipressina x tamponamento com balão, terlipressina x octreotide, e terlipressina x vasopressina) apenas estudos de baixa qualidade foram identificados e nenhuma diferença foi demonstrada. Não houve diferença significativa entre o grupo terlipressina e qualquer um dos grupos de comparação do número de eventos adversos que provocou a morte ou a retirada da medicação.
Com base em uma redução do risco de 34% em relação na mortalidade, terlipressina deve ser considerado no tratamento da hemorragia varicosa aguda. Além disso, uma vez que nenhum outro agente vasoativo demonstrou reduzir a mortalidade em estudos individuais ou metanálises, terlipressina passou a ser o agente vasoativo de escolha em sangramento de varizes aguda.

O que diz o consenso brasileiro?
                                 GED 2011: 30 (Supl. 2): 10-30.

"Deve-se iniciar o emprego de vasoconstritores esplâncnicos o mais precocemente possível em pacientes sob suspeita de hemorragia varicosa, antes mesmo da realização de exame endoscópico.
Recomenda-se administração intermitente da droga na dose de 2 mg em bolus seguido de 1-2 mg de 4/4 horas, a depender do peso corpóreo por 2 a 5 dias. Efeitos colaterais do tratamento podem incluir angina pectoris, infarto agudo do miocárdio, bradiarritmias, isquemia de membros inferiores, isquemia mesentérica e hipertensão arterial sistêmica. A droga deve ser evitada ou empregada com cautela em pacientes com insuficiência coronariana e insuficiência vascular periférica. Seu uso durante a gestação está contraindicado pelo risco aumentado de abortamento espontâneo. A somatostatina também induz redução significante das pressões portal e intravaricosa e do fluxo da veia ázigos, mas de efeito mais transitório na dose habitual de 250 mcg/hora, sendo observado efeito mais persistente com dose mais alta de 500 mcg/hora. Recomenda-se administração de 250 mcg em bolus, seguida por infusão contínua de 250 mcg/hora por 2-5 dias. O octreotide é um análogo da somatostatina que, embora se associe apenas à redução transitória ou nula da pressão portal, exibe ação na prevenção da sua elevação pós-prandial. É habitualmente empregado em bolus de 50-100 mcg, seguido de infusão contínua de 25-50 mcg/hora por 2-5 dias. Os efeitos colaterais principais da somatostatina e seus análogos são dor abdominal, diarreia, hiperglicemia e cefaleia.
O uso dessas drogas deve ser estendido por 2 a 5 dias. O seu emprego por 5 dias pode reduzir a frequência de recidiva hemorrágica.
Muito embora o tratamento farmacológico possa ter eficácia semelhante ao tratamento endoscópico no controle do sangramento varicoso, existem evidências de superioridade no controle do sangramento e na frequência de recidiva hemorrágica com o emprego do tratamento combinado farmacológico e endoscópico.
 Não se deve mais empregar vasopressina associada a nitratos como tratamento farmacológico para sangramento varicoso."
* Modificado do consenso - erro de grafia na publicação. Na bula do stilamin (somatostatina) "Stilamin deverá ser administrado, em solução salina estéril e apirogênica, por infusão intravenosa contínua na dose de 3,5 mcg/kg/hora (em média 250 mcg/hora)." 

Terlipressina - posologia na bula: "...A dose de manutenção é de 1,0 a 2,0 mg de Glypressin, de acordo com a variação do peso do paciente: 1,0 mg de Glypressin para pacientes com até 50 kg, 1,5 mg para pacientes entre 50 a 70 kg ou 2,0 mg para pacientes com mais de 70 kg."

Interações medicamentosas: cautela no uso de terlipressina associado a medicações que ocasionem bradicardia (propofol, fentanil) pois este efeito pode se tornar mais frequente e exigir suspensão da medicação. O uso concomitante de propofol e terlipressina deve ser evitado pelo risco de bradiaaritmias. Na bula do glypressin (terlipressina): "Interações medicamentosas: O tratamento concomitante com medicamentos que são conhecidos por reduzirem o batimento cardíaco (indutores de bradicardia) como por exemplo propofol e sufentanil poderão causar bradicardia severa."

Referências:
Uptodate.com (2012)
Ioannou G. et. al.  Cochrane Database Syst Rev. 2003;
Bittencourt. P, et. al. GED 2011: 30 (Supl. 2): 10-30.



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