quarta-feira, 17 de agosto de 2011

PEEP na SDRA: fisiologia e evidências

TC de tórax - SDRA

              O uso de elevados níveis de pressão expiratória final positiva (PEEP) na Síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) é habitualmente empregado com objetivo de melhorar a oxigenação. Fisiologicamente os efeitos da PEEP responsáveis por otimizar a oxigenação são relacionados ao aumento da capacidade residual funcional com manutenção de unidades alveolares abertas na expiração, no recrutamento de unidades alveolares colapsadas, na redistribuição da água extravascular pulmonar e no aumento da pressão alveolar média com melhora da relação ventilação-perfusão....

              Porém algumas ressalvas merecem destaque no contexto fisiológico. As lesões pulmonares na SDRA são heterogêneas com colapso gravitacional predominante. A aplicação de pressões elevadas podem causar hiperdistensão de áreas sadias e pouco efeito nas áreas de colapso, com consequente potencial dano adicional ao parênquima pulmonar e perpetuação da lesão inflamatória.
               Além disso é importante lembrar das interações coração-pulmão. Valores de PEEP elevados podem causar danos hemodinâmicos significativos em pacientes não adequadamente ressuscitados ou com disfunção miocárdica significativa, em especial os casos com comprometimento do ventriculo direito.
               Existem evidências para aplicação clínica de elevados níveis de PEEP na população com SDRA? O conceito fisiológico tem um racional para sua aplicação. Na prática conseguimos melhorar a oxigenação na maioria dos pacientes com SDRA, reduzindo as necessidades de elevadas frações inspiradas de oxigênio.
               Diante do conceito estabelecido que pacientes com SDRA devem ser ventilados dentro de uma estratégia protetora, respeitando níveis de pressão de platô < 30 cmH2O e volume corrente ~ 6ml/kg, diversos estudos randomizados foram desenhados buscando responder a questão: elevadas PEEPs trazem benefício na mortalidade ?
               Os tres principais estudos recentes incluem o ALVEOLI, o LOVS e o EXPRESS. As metodologias na determinação do valor da PEEP e ajuste da FiO2 foram diferentes nos estudos, o que prejudica a análise conjunta dos dados. Resumidamente, o ALVEOLI e o LOVS seguiam uma tabela pré-estabelecida de ajuste da PEEP de acordo com a FiO2 necessária para manter uma SaO2 88-90% e o EXPRESS permitia o uso da maior PEEP possível desde que se mantivesse uma pressão de platô máxima de 28-30cmH2O.  Nenhum dos estudos conseguiu mostrar significativo benefício de redução da mortalidade na população randomizada para níveis elevados de PEEP.


               Uma observação interessante provém das análises de subgrupos nesses estudos, apesar das conhecidas limitações estatísticas nessa situação. O critério de inclusão permitia a randomização de pacientes com lesão pulmonar aguda (LPA), cuja gravidade é sabidamente difenrente dos pacientes com SDRA. Na população de pacientes mais graves (relação PaO2/FiO2 < 100), tornou-se evidente benefícios como redução na mortalidade na UTI e hospitalar, além da redução na necessidade de terapias de resgate para hipoxemia refratária.
              Uma recente metanálise analisou os três artigos citados, sugerindo um benefício no uso de PEEP mais elevada na população selecionada com pior relação PaO2/FiO2. Até o presente não existem evidências diretas em relação a utilização de manobras de recrutamento alveolar como estratégia terapêutica rotineira, ficando limitada a intervenções de resgate ou populações selecionadas.
               Outras possibilidades ? 
               Novas tecnologias tem sido estudadas na identificação de pacientes com maior potencial de recrutamento alveolar, selecionando subpopulações que teriam maior benefício de estratégias com PEEP elevada e manobras de recrutamento alveolar, prevenindo a hiperdistensão de unidades alveolares sadias e piora da lesão induzida pela ventilação. Alguns desses adventos incluem o uso da tomografia computadorizada na elegibilidade de pacientes potencialmente recrutáveis, ou mesmo na realização das manobras com pressões elevadas com maior segurança. A tomografia com impedância também parece ser uma tecnologia que nos auxiliará no futuro.
               Concluindo, os pacientes com SDRA difusa e hipoxemia grave podem ter benefício com elevados níveis de PEEP, sem evidências no desfecho mortalidade considerando os principais estudos randomizados até o presente. É importante a análise individualizada e a avaliação dos potenciais eventos adversos do uso de PEEP elevada. Alguns trials em andamento podem nos fornecer mais segurança em breve (OLA / ECMOtrial).

Referências:

1.http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18270352

2.http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18270353


4. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20197533               
                                

3 comentários:

  1. Eduardo de Souza Pacheco17 de agosto de 2011 às 13:46

    Parabéns pelo post.... Gostaria que vc comentasse a estratégia de manter o PEEP alto visando uma relação PO2/FiO2> 200 em pacientes que não tem o diagnóstico de SDRA, não seria esta estratégia prejudial a estes pacientes?
    Grato

    ResponderExcluir
  2. Aproveitando o tema, sugiro um post sobre o uso de corticóide na SDRA. Parabéns pelo Blog!

    ResponderExcluir
  3. Eduardo,
    Como exposto, fisiologicamente o racional do uso de PEEPs mais elevadas na SDRA pode trazer algum benefício em relação a PaO2/FiO2, porem esse benefício na população com condições pulmonares de LPA não parecem traduzir benefício e sim, como bem colocou, pode ser prejudicial, especialmente pelos efeitos deletérios tanto relacionados a hiperdistensão alveolar gerando mais lesão, quanto pelos efeitos hemodinâmicos desta. Deve-se ter cautela nesse contexto e procurar estratégias não muito agressivas com PEEPs elevadas.

    ResponderExcluir