quarta-feira, 11 de abril de 2012

Fluidoresponsividade: como e quando? O enigma do intensivista.

# Postado por Dr. Sérgio Sônego Fernandes, residente de medicina intensiva da Unifesp #

            Caso clínico: paciente feminina, 38 anos, internada há 4 dias na UTI pós craniectomia descompressiva por AVCi de cerebral média maligno. Sedada, vinha em uso desde o POI de noradrenalina para manutenção da pressão de perfusão cerebral. No 3° PO evoluiu com queda de pressão arterial provavelmente relacionada a sepse de foco pulmonar.. Realizada expansão volêmica com 2L de soro fisiológico (30mL/kg) com melhora clínica parcial. Optado neste momento por realizar ultrassonografia de veia cava inferior (VCI)... (clique abaixo para continuar lendo)





                                               Figura 1. Ultrassonografia de veia cava inferior pré-infusão de volume.

 A USG (janela subcostal, VCI a 3cm do átrio, modo M) evidenciava um índice de distensibilidade de VCI de 28% utilizando diâmetros máx-mín/mín e 24% com diâmetros máx-mín/médio. (Pontos de corte entre respondedores e não respondedores: 18 e 12%, respectivamente). Ver figura 1.

Realizada infusão de mais 1000mL de soro fisiológico, com  novo USG a seguir:

 Figura 2. Ultrassonografia de veia cava inferior pós-infusão de volume.

Novos índices de distensibilidade de VCI: 0 e 1%
Obteve-se clinicamente discreta melhora, com decisão naquele momento do manejo sem infusão de mais fluidos.

A dúvida da fluidoresponsividade é um dos nossos principais dilemas do dia-a-dia na UTI. Inúmeras vezes estamos frente a um paciente com uma clara necessidade de aumento de débito cardíaco. Nem sempre está claro se poderemos atingir esse objetivo com a infusão de fluidos. Devemos sempre ter em mente que a expansão volêmica quando mal aplicada, por mais bem intencionada que seja, pode incorrer em consequências danosas. Predizer a fluidoresponsividade tornou-se uma poderosa ferramenta a beiro leito na UTI. Infelizmente não existe (e talvez nunca exista) um método com acurácia perfeita. O USG é mais um desses instrumentos com suas vantagens e desvantagens. A mudança no diâmetro da veia cava (tanto inferior como superior) durante a ventilação mecânica é um preditor de fluidoresponsividade (1-3). Na situação apresentada, a disponibilidade rápida, não invasiva e a anatomia da paciente favoreceram o uso do USG para prevermos se a paciente responderia ou não a nova infusão de fluidos num momento de incerteza quanto a essa estratégia.
Por fim, nas situações como o deste post há cada vez menos espaço para a conduta do “Let's Give Some Fluid and See What Happens”, com diz JL Vincent (4). Devemos respeitar os potencias danos da infusão de fluidos em pacientes que não o necessitam e procurar utilizar os métodos que estiverem ao nosso alcance para “fazer volume” com a maior segurança possível.

1. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15045170
2. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15034650
3. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/15375649
4. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21792055

11 comentários:

  1. I t's looks like if you have not read the Editorial "Let's give some fluids and see what happens", or I don´t understand why you use it in the sense that you propose. The concept explained there came to the same problem: we don't want to give fluids when they patient doesn't need it, he's not saying that we must give fluids to everybody. He tries to explain that when you decide to assess the volume responsiveness you can use other technique, but you must to well know the limitations: an ultrasonography or a pulse pressure variation doesn't work to everybody (if you don't know it then you will believe that all the times that you have a variation in the diameter of the cave vein you will have the right to give volume or don't do it (this technique have a lot of limitations but for some patients could work). And the same happens with every method that you decide to use, even with the fluid challenge, that why he says that if you decide to perform a fluid challenge you must select limits and goals, and if you don't find what you´re looking for then why to go further?
    I don't think that you will kill or change the prognosis when give 500 ml of a crystalloid or colloid, or 1 liter or 300 ml (you can choose), defining a priori specific safety limits; and maybe you'll find the response that you're looking for.

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    1. Quanto ao editorial publicado pelo Dr. Jean-Louis Vincent, ele ressalta as limitações e os cuidados na interpretação das ferramentas validadas para predizer fluidoresponsividade. Além disso, reforça a necessidade de sempre questionarmos os objetivos da infusão de fluidos, distinguindo os conceitos de necessidade e responsividade ("...fluid loading is reserved only for those who will benefit...").
      Acredito que a idéia do post, exposto pelo Sérgio, tenha sido ilustrar tecnicamente a factibilidade beira leito da avaliação do indice de distensibilidade da veia cava inferior como um método dinâmico capaz de predizer a resposta clínica à infusão de fluidos, com melhor acurácia do que uma simples "prova de volume" (conforme validado por alguns artigos expostos em um post anterior), sempre somada aos demais parâmetros clínicos. Especialmente os pacientes com SDRA, disfunção renal oligúrica, disfunção ventricular direita ou síndrome compartimento abdominal merecem mais atenção no emprego de volume, sendo as provas de fluido resposta uma alternativa interessante.
      Cabe ressaltar, conforme exposto no texto e no próprio editorial mencionado, as principais limitações relacionadas a este método (assim como os demais métodos também tem limitações), especialmente quanto a necessidade dos pacientes estarem sedados e em ventilação mecânica controlada, com parâmetros ventilatórios limitados, podendo sofrer influência na presença de hipertensão intraabdominal.
      Finalmente, quanto à sobrevida, certamente uma "prova de volume" isolada dificilmente será responsável por um impacto direto na sobrevida, porém faz parte de um pacote de medidas assistenciais que somadas podem interferir neste desfecho.
      Outro artigo interessante que aborda o manejo da fluidoterapia nos pacientes sépticos menciona: "When a patient has indications for a fluid bolus, the potential for harm should be considered and, if there is reasonable potential for harm, a dynamic predictor should be used to limit fluid infusion only to patients who will benefit. We believe there is room for much further study to identify whether this, or some other fluidrestrictive approach, confers improved outcomes in resuscitated septic patients". Vale a leitura...

      Referência:
      1. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/18187750

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  2. Diego,
    maybe my post, with a medical case as example, has not been so clear. The main ideia is the importance of conscious fluid administration and, as method for it, the avaliation of its responsiveness.
    We know that all the tools we have for it are limited. So, they need to be carefully applied, with well-defined objectives. Actually, JL Vincent´s editorial context is different, but the common idea is that the fluid loading must not be blinded. That´s the point!
    Thank you for your interest and comments!

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  3. Parabens pelo post Sergio
    Apenas gostaria de fazer algumas perguntas e reparos quanto ao caso: Qual era o sodio do paciente quando vcs comecaram a reposicao volemica? Estava em hipernatremia induzida apos a hemicraniectomia? Qual o motivo de usar noradrenalina como medida para "aumentar a perfusao cerebral"? Estavam medindo PIC, Licox,Bowman, Microdialise ou compressed EEG para monitorar CBF?
    Grande abraco

    Ivan Rocha
    Neurocritical care unit
    Cleveland Clinic Foundation

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    1. Ivan,
      o sódio sérico da paciente estava em 153mEq/L. Veio do centro cirúrgico à UTI neurológica com cateter intraventricular para monitorização da PIC, em uso de noradrenalina para manutenção de PPC. Essa é uma medida usual no nosso serviço. Não temos disponibilidade de outros métodos de monitorização.
      O que vocês costumam fazer na Cleveland com esses pacientes?
      Abraço!
      Sergio.

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    2. Sergio, perguntei quanto ao sodio pq as vezes SF pode diminuir o sodio, o q seria nao muito indicado neste paciente. Quanto a PPC, depois de hemicraniectoia o CBF se reestabelece e a PPC perde o sentido, incluisve se vc mantiver uma PPC alta pode aumentar o edema cerebral. Alem disso, existe evidencia na literatura q o monitor de PIC nesses paciente mais atrapalha do q ajuda, devido a falta de acuracia. Se tem duvida se a pressao de perfusao eh adequada ou nao, medidas indiretas de fluxo, como as que eu citei acima, sao muito uteis
      De novo, parabes pelo post!
      Grande abraco!!
      Ivan

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    3. Olá dr. Rocha, sou estudante de medicina do 5o ano e ficaria muito feliz se o senhor discorresse um pouco sobre como SF0,9% pode diminuir o sódio, já que ele tem 154mEq/l.

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    4. ola thiago
      o valor calculado de osmolalidade do NaCl 0.9% eh em torno de 308, mas quando vc usa um osmometro, esse valor cai para 285. A osmometria eh muito mais fidedigna, portanto em um paciente com edema cerebral e provavelemente tb um controle de adh comprometido pela hipertensao intracraniana, 285 eh uma osmolalidade considerada baixa
      Abs

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    5. Grande, Ivan. Esta é uma situação comum na instituição que trabalho. É difícil convencer os colegas que PIC em paciente craniectomizados perde a acurácia, portanto condutas baseadas nesses valores podem ser iatrogênicas.
      Abraço.

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  4. A determinação do Delta PP não seria mais fidedigna para avaliar a necessidade extra de fluidos nesse caso?

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  5. penso que, nesse caso, o volume de sf 0,9% só piora o caso, pois vai diminuir a viscosidade do sangue, vai apenas encharcar a paciente.

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